Presteza que beira ao conformismo define bem Cathy Whitaker (Julianne Moore)? Seria Cathy a Amélia de Ataulpho Alves e Mário Lago? Em uma sociedade totalmente pautada pelas aparências, onde os resultados do sucesso dependiam únicos e exclusivamente, da sua reputação, Cathy para além da síndrome de Amélia, não era apenas uma mulher fútil e afetada, como muitas da sua classe social. No entanto, em pouco tempo, sua vida desmorona. Antes presente na coluna social de sua cidade, tida como possuindo o modelo ideal de família, acaba sem ninguém a sua volta.
Nos momentos iniciais de “Longe do Paraíso”, escrito e dirigido por Todd Haynes, tive a impressão de estar em um dos épicos de Tennessee Williams, filmado por Elia Kazan. Ninguém melhor que esse dramaturgo americano retratou nas páginas dos livros as tensões vividas pelos homossexuais. E o homossexualismo é um dos elementos com que Cathy se depara. Mãe de duas crianças, e casada com Frank Whitaker (Dennis Quaid), descobre que seu marido é gay. Em busca de uma correção desse comportamento “desviante”, ele procura terapia tentando se livrar do “mal” que o faz se interessar por homens.
Outro tema tratado no longa é a questão racial. Cathy que se interessava por arte moderna, também era defensora dos direitos civis dos negros, uma mulher bastante avançada para a sociedade conservadora dos anos de 1950. Com seu casamento já em declínio, ela passa a conviver com seu jardineiro (Dennis Haysbert) e isso terá profundas conseqüências tanto para a própria Cathy, quanto para o próprio jardineiro.
Esteticamente o filme é belíssimo, a fotografia é de um primor que enche os olhos a cada tomada. A película foi feita para ter um clima de perdido no tempo, como se fosse uma miragem ou um sonho. Nada melhor então do que filmar nos cenários de outono, onde a paisagem do hemisfério norte é tomada por tons amarelados e alaranjados, e por folhas que caem das árvores caducifólias.
Cathy não era uma Amélia, puro e simplesmente. Era uma mulher dedicada a sua família, que, no entanto, vivia entre dois mundos. O falso e vazio mundo das aparências do ambiente que socialmente frequentava, visto que pertencia a uma elite local, e aquele mundo que acreditava. Acho que na verdade ela era uma sonhadora, para ela não havia obstáculos incapazes de serem transpostos, é verdade que isso beira a ingenuidade. Mas ela conseguiu ver no seu contato com o jardineiro a possibilidade de realização dessa utopia em plenos anos 50. Vivendo essa ambigüidade e, com certeza, angustiante condição está a Julianne Moore. E é preciso dizer, que performance inesquecível ela entrega aos espectadores. Sutil e delicada como as cores do outono, convincente como os ideais que acreditava, mas também ambivalente e confusa quando o mundo que vivia e que acreditava são postos em xeque. Por tratar de temas tão relevantes ainda nos tempos atuais, por ter uma cadência que a ambientação do filme se propõe, e pela atuação multifacetada e, por isso, brilhante da Julianne Moore, Longe do Paraíso é um longa que eu recomendo.
-------------------------------------------------------------------------------------------------
Far from Heaven (Longe do Paraíso), Estados Unidos - 2002. Dirigido por Todd Haynes. Com: Julianne Moore, Dennis Quaid, Dennis Haysbert, Patricia Clarkson, Viola Davis. 107 minutos. Gênero: Drama.
Nota: 9,5
2 comentários:
Bem-vindo de volta! rs Gosto muito deste filme, em especial pela técnica e por Moore. Preciso, porém, rever. Haynes é sempre interessante.
Oi, Santiago
Andava sumido, menino!!! O que tem feito, o que tem visto?
Também gosto muito de "Longe do paraíso", pela proposta em si e pelo trabalho estético, dramático e artístico. Julianne Moore está sensacional, assim como Dennis Quaid.
Abração e vê se não some, mais
Clênio
www.lennysmind.blogspot.com
www.clenio-umfilmepordia.blogspot.com
Postar um comentário