sexta-feira, 9 de outubro de 2009

ALL ABOUT BETTE DAVIS - Parte V

BETTE DAVIS: SEUS ÚLTIMOS SUCESSOS E ÚLTIMOS ANOS DE VIDA

Foto 1 - Bette Davis com o então marido Gary Merrill e os filhos

Após sair da Warner Bros., aos 42 anos de idade, Bette ficou só pela primeira vez e com uma filha de dois anos. Na mesma época, divorciou-se do seu terceiro marido. Exatamente neste período propuseram a ela a personagem Margo Channing. O filme foi All About Eve e o ano 1950. Depois das filmagens Bette "fugiu" para o México com o ator Gary Merrill que viveu o diretor Bill Sampson no longa. Lá, eles adotaram duas crianças, mas depois de 10 anos juntos, seu quarto casamento também chegava ao fim.

Foto 2 - Cena do filme All About Eve (1950), Anne Baxter (Eve) e Bette Davis (Margo Channing)

Na véspera das filmagens de All About Eve, Edmundo Goulding, que dirigiu Bette em Dark Victory, telefonou para Mankiewicz e disse: “Ficou maluco, rapaz? Como pode contratar essa mulher? Ela o destruirá. Vai transformá-lo em pó bem fino e soprá-lo para longe. Você é um escritor, rapaz. Ela chegará ao set com uma resma de papel e com um lápis. Em seguida, reescreverá tudo. Então ela, e não você, dirigirá o filme. Anote bem minhas palavras.”

Mankiewicz conta que no primeiro dia de filmagem não tirou da cabeça as palavras de Goulding. Ele ajustou as antenas para captar possíveis avisos de tempestade. A Srta. Davis chegou ao set completamente vestida e maquiada, pelo menos, quinze minutos antes da hora marcada. Acendeu um cigarro e abriu o script – não, conforme notei imediatamente, na página da cena que filmaríamos naquela manhã. Seu desempenho foi perfeito. Cada sílaba foi perfeita. Não houve hesitação em busca de palavras. Ela assumira totalmente as falas – como Margo Channing. Eis o sonho de qualquer diretor: a atriz preparada.

Paralelamente ao seu novo casamento que, de forma surpreendente, a encheu de otimismo, Bette teve um triunfo no sucesso internacional de All About Eve. Sua interpretação de Margo Channing, a um só tempo extravagante, absurda, trágica e espirituosa, valeu-lhe os mais rasgados elogios que recebeu em muitos anos. Seu desempenho brilhantemente constante era o resultado de anos de refinamento técnico; acima de tudo, o desenvolvimento de uma vivência perspicaz e sábia, lapidada pela experiência. Margo Channing e All About Eve representaram o clímax da carreira de Bette Davis. É DE ABISMAR QUE ELA NÃO TENHA RECEBIDO O OSCAR PELO TRABALHO. Mas foi consolada pelo Prêmio do Círculo de Cinema de Nova York, pelo Prêmio dos Críticos de São Francisco, pelo Prêmio do Festival de Cannes como melhor atriz e pela nona indicação ao Oscar. Abaixo, pode-se ver uma das cenas clássicas do filme, quando Margo Channig diz: Fasten your seatbelts, it's going to be a bumpy night!


No dia da entrega do Prêmio Oscar todos aguardavam por uma notícia espetacular. Quando as palavras “E a vencedora do prêmio de melhor atriz é...” vieram pelo rádio, Bette levantou-se de um salto. Quando escutou a conclusão “Judy Holliday”, sentou-se bruscamente. Ela também concorria com Gloria Swanson por sua performance em Crepúsculo dos Deuses (1950), outro clássico e outra interpretação brilhante, e com Anne Baxter que fez o papel de Eve em All About Eve. Muito estranho o Oscar não ter ido para Bette ou Glória Swanson. Mais uma “brincadeira” do júri da Academia. Após ouvir o resultado, desempenhou diante de todos que estavam com ela o maior papel da sua vida, mentindo com consumada valentia: “Isso é ótimo! Ganhou uma novata! Eu não poderia estar mais satisfeita!” Ninguém acreditou nela, como também não acredito, e interpreto sua reação como possuindo um fortíssimo teor irônico.

Foto 3 - Bette Davis, ou melhor, Margaret Elliot passeando embriagada com Oscar

Depois do sucesso estrondoso de All About Eve os sinais de declínio eram visíveis. Nada mais ocorreu em sua carreira tirando fracassos melodramáticos e papéis secundários em filmes sem importância. Para os críticos um desses deprimentes exemplos é The Star (1953) que mostra a história de uma atriz decadente, reduzida a vender lingerie, discutir com a família e dirigir embriagada através de Beverly Hills, cenário do seu passado de glória. Isso foi um prato cheio para os críticos. Um convite para as críticas que afirmavam que ela era um fracasso por demais evidente. Escreviam coisas do tipo, “As orquídeas... os casacos de pele... as jóias... tudo que pertencia à estrela se foi... e nada restou... senão a mulher!” Qualquer semelhança com Crepúsculo dos Deuses (1950) acredito ser proposital. A única coisa boa, é que seu desempenho rendeu sua décima indicação ao Oscar de melhor atriz.

Foto 4 - Cartaz do filme The Catered Affair (1956)

Em 1956, The Catered Affair, foi mais um prova de fogo dada a atriz. Ela vivia a transição da juventude para a maturidade. O papel de mãe abandona qualquer característica romântica de papéis interpretados anteriormente. Adeus a mocinha romântica. Sua performance nesse filme continua sendo uma das suas realizações culminantes. Ela conseguiu controlar todos os seus maneirismos e problemas a fim de produzir um desempenho rigoroso e magnificamente realista. Nesse ínterim, doenças, problemas familiares e a morte da sua mãe Ruthie, tudo isso acontecendo numa época de pouca satisfação profissional. Trabalhava por muito menos dinheiro, e em filmes arriscados e de baixo orçamento.

Foto 5 - Glenn Ford e Bette Davis (nos extremos) numa cena do filme Pocketful of Miracles (1961)

Em 1961, aceita fazer Pocketful of Miracles, dirigido por Frank Capra, onde vivia Apple Annie. Glenn Ford que já trabalhara com Bette em A Stolen Life (1946) deu uma infeliz entrevista dizendo que o papel interpretado por Bette em Pocketful of Miracles a resgataria da obscuridade, e que ele colaboraria com isso. Bette leu a entrevista de Glenn e ficou furiosa como o diabo, conta Capra. Berrou para ele: “Quem esse filho da puta pensa que é para dizer que me ajudou a retornar! Eu nunca deveria ter voltado a Hollywood! Odeio vocês todos! E Apple Annie, acima de tudo! Aquele merdinha não me ajudaria a sair de um esgoto! Eu deveria estar doida quando voltei!” Não é preciso dizer que depois disso o clima nas filmagens ficou bastante pesado.

Foto 6 - Ruthie, mãe de Bette, e Bette

Nos últimos dias das filmagens de Pocketful of Miracles, Bette foi surpreendida pela morte súbita de Ruthie. Nos últimos anos, Ruthie afastara-se um pouco da vida da filha, mas a influência dominante da mãe na carreira dela persistia e jamais seria esquecida. Basicamente, o livro escrito por Bette, The Lonely Life trata da sua extraordinária mãe.

Foto 7 - Bette Davis, Jack Warner e Joan Crawford antes do início das filmagens de What ever happened to Baby Jane? (1962)

Em 1962, somos premiados com o filme, What ever happened to Baby Jane? O mesmo, a devolve ao estrelato e lhe custou a sua décima primeira indicação ao Oscar. O longa é a história de duas ex-atrizes infantis que residiam em Hollywood no começo da velhice. É estrelado por Bette Davis e Joan Crawford. Isso produziu um efeito impactante, um pacote eletrizante, carregado de energia e foi altamente sensacional. Para Robert Aldrich, o diretor do longa, Joan e Bette não tiveram brigas em Baby Jane. Comportaram-se com absoluta perfeição. Jamais deixaram escapar uma palavra abrasiva. Não tentaram roubar as cenas uma da outra.

Foto 8 - Robert Aldrich e Bette Davis discutindo cena do filme What ever happened to Baby Jane? (1962). Ensaio da cena em que Baby Jane "espanca" sua irmã Blanche. Atenção para a concentração de Bette.

O resultado foi que os desempenhos de Bette e Joan foram admiráveis sob todos os aspectos. Em vez de simples figuras grotescas, criaram personagens tocantes e convincentes. As cenas foram excepcionalmente interpretadas e dirigidas. O filme sustentou um clima de pesadelo cru, sem sentimentalismos, que se adequava perfeitamente a atmosfera de Hollywood. Lembrando que o filme foi gravado para a Warner Bros. o antigo estúdio de Bette. A seguir, Baby Jane (Bette Davis) cantando a música I've written a letter to daddy. Simplesmente, imperdível!


Curiosidade sobre Bette e Joan. Joan Crawford, bem como o seu rosto grande e imponente, usava pesados e ligeiramente ameaçadores agasalhos de pele. Tinha um ar intimidador que desafiava fortemente tanto amizade quanto inimizade. Crawford também nutria há anos um desejo secreto por Bette. A mais sofredora das estrelas do cinema adorava a maior atriz, tanto sexual como profissionalmente. Assim que chegou à Warner Brothers nos anos de 1940, passou a enviar perfumes, flores e cartas implorando que Bette fosse jantar com ela. Bette não gostava dessas gentilezas da colega e devolvia todos os presentes, agradecendo a consideração dela.

Provavelmete no intuito de promover o filme, Bette escreveu nos classificados de um jornal de Hollywood o seguinte anuncio:

Foto 9 - Anúncio publicado no The Hollywood Reporter em 1962

ARTISTA PROCURA EMPREGO. Americana, divorciada, mãe de três filhos (10, 11 e 15 anos). Trinta anos de experiência como atriz de cinema. Ainda em condições de movimentar-se e mais afável do que dizem os rumores. Procura emprego fixo em Hollywood. (Fartou-se da Broadway.) Respostas para: Bette Davis a/c Martin Baum, G.A.C. DÁ REFERÊNCIAS.

A opinião geral em Hollywood foi que isto significava que Bette estava arruinada. Mas não era muito bem isso. Felizmente, as excelentes críticas tanto para Baby Jane quanto para o livro The Lonely Life, seu livro de memórias, seguido pelo enorme sucesso comercial de Baby Jane, tornaram sem sentido os comentários negativos dos inimigos de Bette.

Tentando repetir o sucesso do filme What ever happened to Baby Jane?, Aldrich dirigiu Hush... hush, sweet Charlotte (1964) tentando juntar novamente Bette e Joan. Mas isso não foi possível e quem acabou ao seu lado foi sua amiga, Olivia DeHavilland e Joseph Cotten. É claro que o filme não chega nem aos pés do seu antecessor, mas tem boas participações dos experientes atores. Abaixo duas boas cenas do longa. Em ambos, pode-se ver estampado no rosto de Bette Davis (Charlotte) os sintomas da loucura, e no de Olivia DeHavilland (Miriam) o ódio que sente pela prima.



A verdade é que após seus últimos sucessos no começo dos anos de 1960, ela não logrou êxito em nenhum outro projeto no cinema... Tentou várias vezes voltar ao teatro, mas sentia-se nervosa e pouco confiante. Entretanto, havia formado um público que independentemente do que fizesse a seguia e a aplaudia chegando a causar inveja no restante do elenco. A plateia chegava ao êxtase quando a via interpretar!

Foto 10 - Bette Davis como Mrs. Taggart em The Anniversary (1968)

Um filme que ainda não vi, mas que sinto vontade de assistir é The Anniversary (1968). Ele conta a história de uma mãe terrível, grosseira, possessiva e maníaca. Nesse papel, Bette usa uma venda no olho esquerdo o que acentua seu caráter extravagante e excêntrico, mas que ela detestava ter que usar. Detalhe, a cor da venda varia de acordo com a cor da roupa. Só a cena em que Bette desce a escada é imperdível, ela é o exemplo de que nem todas as mães vão para o céu. Ver trailer a seguir.


Foto 11 - Bette Davis como Bette Davis

Até seu último ano de vida ela trabalhou. Seus dois últimos longas, que preciso ver, são: The Whales of August de 1987 e Wicked Stepmother de 1989. Já nos últimos anos de vida, dizia: “Gosto de trabalhar. Acho que por isso continuo viva. De vez em quando tem um papel e digo: Quem dera tivesse uns 40 anos a menos para poder fazê-lo. Foi incrível que uma tímida garota de Boston tivesse uma vida assim.”

Bette ainda conservou seu senso de humor. Ao completar 70 anos recebeu os amigos com o rosto pintado de preto empunhando um banjo. Em 1977, recebeu o prêmio por realização em vida atribuído pelo American Film Institute. Em 1989, após ser homenageada na Espanha em um festival, teve problemas de saúde. Debilitada para enfrentar uma longa viagem até os Estados Unidos, viajou até a França. Pouco tempo depois, no dia 06 de outubro de 1989 viera a falecer.

Foto 12 - Lápide de Bette Davis onde pode ser lido o seu epitáfio: She did it the hard way. Clicando na foto, pode-se ver a foto maior.

Seu epitáfio é o seguinte: “She did it the hard way”. Sem dúvida, isso resume a história de vida dela. Ela percorreu o caminho que escolheu para sua vida de maneira dolorosa e difícil. A vida não lhe foi fácil e o sucesso nem sempre bateu à sua porta. Durante toda essa semana, resumi a difícil trajetória dessa grande estrela do cinema americano, que em pouco tempo, se tornou para muitos, e para mim, na primeira dama da sétima arte. Sua saída do seio de uma família puritana do estado de Massachusetts, sua entrada para cursos de teatro, as recusas. Ao seu lado, sua mãe divorciada, que muitas vezes de maneira compulsiva e instintiva seria capaz de matar e morrer para que a filha chegasse ao estrelato. Aliado a isso, uma irmã que sofria de transtornos mentais, e precisava de cuidados especiais. Tudo isso, os esforços da mãe, a saúde frágil da irmã, as recusas e o difícil caminho para entrar no teatro inicialmente, aumentavam sua ânsia de aperfeiçoamento e sua persistência atrás do sucesso. Vencedora duas vezes do Oscar, o maior prêmio da Academia Americana de Cinematografia, ostenta 11 indicações, sendo uma delas, sem estar nos boletins de voto. Durante muito tempo foi a recordista em indicações, hoje, superada por Katharine Hepburn com 12 indicações e Meryl Streep com 15 indicações ao prêmio.

Bette nunca possuiu a beleza de outras atrizes, mas sempre foi dona de um talento nato e em constante aperfeiçoamento. Tornou-se detentora de um vasto repertório com grandes interpretações e grandes papéis ao longo da carreira. Desde mocinhas dominadoras e maniqueístas a mulheres maduras e em crise, com ênfase para os seus dois últimos sucessos, All About Eve (1950) e What ever happened to Baby Jane? (1962). Observação, em um desses dois últimos deveria ter levado o Oscar de melhor atriz. Ela foi a prova viva de que perseverança e busca noite e dia por um objetivo faz você alcançá-lo. Entretanto, essa procura incessante teve um preço. No seu caso, no final dos anos de 1940, já era reconhecidamente a maior atriz do cinema mundial, mas esse posto alcançado precisava ser mantido. E foi, só que ao custo de não gozar de uma vida particular tranquila. Sempre em relacionamentos turbulentos, e tendo sempre que arcar com elevados custos de vida seja seu ou de seus familiares, não parava um minuto de trabalhar. E isso se refletia na sua saúde bastante frágil. Em um mundo de resultados como era o da indústria cinematográfica de Hollywood houve épocas em que chegou a fazer cinco filmes seguidos em apenas um ano, tudo isso sem férias ou descanso. Também criou muitas inimizades, a título de grande rainha do cinema, mandava e desmandava nas produções. Certos diretores e atores a odiavam, pois com ela, não havia moleza, era uma grande profissional. Mesmo aparentemente sendo muito séria possuía um humor sagaz bastante aguçado, além de um coração prestativo para aqueles que se demonstravam interessados em progredir. Fez amigos, mas sua lista de inimigos não era pequena.

Foi uma mulher batalhadora que cuidou bem do seu espaço, inteligente e forte. Lutou por seus direitos e arrematou uma multidão de fãs, dentre eles, esse que vos fala. Segundo ela mesma, “Foi incrível, que uma tímida garota de Boston, tivesse uma vida assim.” E eu agradeço por ela ter vivido, e por ela ter se entregado tão sagazmente à arte de interpretar. Há 20 anos que ela nos deixou, mas para os apreciadores do bom cinema, a impressão é que ela está viva, acessível através de seus filmes que nunca deixarão de ser exibidos na televisão, nas coleções de DVD ou nas biografias escritas ao seu respeito. E esse culto em torno do nome de um artista é reservado apenas àqueles que aqui pisaram e conseguiram deixar sua marca. E que marca ela nos deixou!

Todos os textos dessa série especial foram baseados no documentário, Bette Davis: A Basically Benevolent Volcano (1983) e no seguinte livro biográfico: HIGHAM, Charles, 1931-; MATTA, Luiz Horacio da.. Bette Davis. Rio de Janeiro: F. Alves, 1983, ((Coleção Presença)).

IMPORTANTE: Grande parte das imagens que constam nesse especial foram coletadas do google imagens. Por favor, se alguém achar que a imagem foi tirada do seu blog, entre em contato que eu dou os créditos, ou ponho até o logo do tal blog na foto.

No fim de semana, encerrando essa semana comemorativa, pretendo postar alguns vídeos coletados da internet, onde se pode observar como seu nome, ainda hoje em dia, repercute.

Para ver as outras partes: parte 1, parte 2, parte 3, parte 4, parte 6, parte 7

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