O protagonista, Wikus Van De Merwe (Sharlto Copley) é funcionário da MNU - Multi-Nacional United, empresa privada que cuida do acampamento alienígena. Vale salientar, que esta multinacional está mais interessada no comércio de armas detidas do que nos direitos dos aliens. Durante vinte anos, desde sua chegada, os alienígenas estiveram em um espaço separados dos humanos, sem expectativa de voltar para seu planeta. Inclusive, os governantes viam a presença deles como fonte de gerar dinheiro. Pois buscavam lucrar com a venda do arsenal bélico capturado e queriam conhecer a tecnologia desse grupo. Por outro lado, a população comum queria que eles fossem cada vez mais segregados, ou que fossem, uma vez por todas embora. No acampamento chamado Distrito 9, onde eles viviam, se formou um mercado negro comandado pelos nigerianos. Antes de ver o longa, dei uma olhada no trailer, e inicialmente, pensei que se tratasse da questão do apartheid na África do Sul, claro que isso mudou no momento que vi aquela nave gigantesca no meio da cidade de Joanesburgo. Era apartheid, mas em outra perspectiva.
O filme aponta questões de conflito e de tensões relevantes. Quando visto em situação de competição com indivíduos estrangeiros, que não carregam verossimilhanças culturais, grupos tendem a se comportar de forma negativa e hostil. Hoje, um problema relevante tratado por aqueles que estudam migrações internacionais refere-se a essa animosidade, ou melhor, ao fenômeno do xenofobismo. Os extraterrestres foram alocados em um espaço logo abaixo da sua nave, pouco tempo depois, o ambiente tinha se transformado numa favela, com condições deploráveis, além disso, as pessoas comuns pouca informação tinha sobre o local e sobre o que acontecia alí. Sabe o que isso me lembra? A revolta dos jovens nos subúrbios da França em 2005. Eles viviam à margem desta sociedade sofrendo com o racismo, o desemprego e os baixos níveis de desenvolvimento social. Claro que estes indivíduos não eram europeus, muito menos franceses, eram "extraterrestres", que vieram da África, principalmente, das ex-colônias francesas.
Nada melhor do que falar de segregação estando na África do Sul. O filme nos dá algumas lições sobre o tema. Em uma das falas, já que no início o longa se passa como se fosse um documentário, uma mulher diz: "Pelo menos nos mantem separados deles." A abordagem trazida por Distrito 9 é uma nova forma para se falar em discriminação e preconceito. Quando se vê ameaçado, a primeira coisa feita pelos humanos, é tentar se distinguir de alguma forma dos membros do outro grupo. A separação entre o grupo humano e extraterrestre, ou branco e negro, civilizado e bárbaro, todas dicotomias são variações da manifestação da discriminação, ou seja, por pertencer a um grupo diferente do meu, eu dou um tratamento injusto ao outro. Dessa forma, todos os recuros considerados valiosos naquela sociedade são repartidos de forma desproporcional e iniqua. Decorrente desse relacionamento desigual, surge o preconceito, que é a atitude de se julgar uma pessoa com base nas características reais ou imaginárias de seu grupo, que no filme, tais características estão de fato marcadas corporalmente.
Além disso, parecemos ver aquilo que Thomas Hobbes disse no século XVII, o homem é lobo do próprio homem (Homo homini lupus), ou, há uma guerra de todos contra todos (Bellum omnia omnes). No filme, o homem parece estar no seu mais profundo estado de natureza. Sem nenhuma forma de controle ou coerção, todos buscam otimizar suas vontades. Por um lado, a MNU tenta a todo custo capturar o Wikus Van De Merwe para que ele possa operar o armamento que só é ativado com o DNA alienígena; o Wikus sem pensar em mais nada, tenta reverter a efetividade da mutação que toma conta dele, e que o fez ser caçado por todos os lados e negado pela própria esposa; já Christoper é o alien que tenta ajudar Wikus, entretanto, pensa primeiro nos seus pares.
Wikus como dito inicialmente, antes de ter sido infectado pelo vírus extraterrestre trabalhava para a MNU, e no dia da infecção estava desalojando os alienígenas de um acampamento para mandá-los para um outro, bem pior. Além disso, seguia-se os maltratos, as humilhações, os assassinatos e a morte dos filhotes ainda em estágio de ovos dos aliens. Ao passar para o grupo em desvantagem de poder, passa a perceber, de fato, como viviam e como na verdade, só queriam voltar para o seu planeta. Nesse momento, após tantas atrocidades, você já está totalmente envergonhado de pertencer ao grupo dos seres humanos. Pior ainda, sabendo que aquilo é ficção, mas poderia muito bem ser real.
Acredito que o longa possui algumas falhas. Quero destacar o despreparo dos agentes frente as situações adversas. A infecção do Wikus foi algo primário, todo mundo sabe que não se deve manusear artefato inimigo ou estranho com as mãos desprotegidas, muito menos, levar ao rosto para cheirar. Outra coisa, as pessoas são extremamente ingênuas, na festa só não via que o cara estava passando mal quem não queria. Além disso, todo mundo já tinha percebido que o protagonista não iria morrer, inclusive, isso quase nunca acontece. O diretor deveria ter achado soluções mais criativas para essas cenas, ou então, sabendo que ele não iria morrer, não criar essas expectativas baratas.
Por fim, apesar das críticas recebidas pelo filme, na Nigéria, em particular, por tratá-los como criminosos, atrasados, feiticeiros e canibais, Distrito 9 cria uma alegoria criativa para se entender o problema das migrações modernas, da segregação, da manipulação de informações e da ausência de coerção imparcial. Não é um filme descartável, mas também, é menos empolgante comparado ao que se fala dele. Aconselho vê-lo, mas dá para esperar ele ser lançado em DVD, recomendo que você não vá ao cinema por conta dele. Resumindo, temática ótima, mas cinematograficamente, elementar. Ahh, e ainda é daqueles filmes que teimam em ter continuação, uma versão só era suficiente...
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District 9, Estados Unidos/Nova Zelândia – 2009. Dirigido por: Neill Blomkamp. Com: Sharlto Copley, Jason Cope, Nathalie Boltt, Sylvaine Strike, John Summer, William Allen Young. 112 min. Gênero: Ação e Ficção Científica.
Nota: 8.0
3 comentários:
Bela análise do filme, Santiago. As falhas de Distrito 9 apontadas no post acabam deteriorando a mensagem que o filme quis passar. Pra mim, uma decepção já que esperava bastante por ele.
Eu acho que o maior problema de "Distrito 9" é o seu roteiro, que foge do seu propósito inicial em seu quarto final. De qualquer maneira, acho que isso não tira o brilho do longa, que consegue levantar alguns pontos bem interessantes.
cinebuteco,
pois é, se não fosse a atualidade do tema mostrado no filme, não sei o que seria dele.
Abraço.
Kamila,
também não tiro o mérito dos pontos levantados pelo longa, tanto é que ele me proporcionou várias questões mostradas no post, entretanto sua estrutura cinematográfica, nem as interpretações me chamaram atenção. Vi que você respondeu meu comentário em seu blog, acho que você deve concordar que às vezes é bem salutar ouvir/ler opiniões diversas das nossas, não é? Caso contrário, não haveria o contraditório, nem discussões.
Abraço.
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